segunda-feira, 1 de setembro de 2025

Cannabis Medicinal na Saúde Mental e sua Relação com o Setembro Amarelo

 


Introdução

O Setembro Amarelo é uma campanha mundial voltada à conscientização e prevenção do suicídio, um grave problema de saúde pública que envolve fatores biológicos, psicológicos e sociais. No Brasil, estima-se que mais de 14 mil pessoas tirem a própria vida todos os anos, o que representa uma morte a cada 40 segundos no mundo (OMS, 2023).

Neste contexto, cresce o interesse científico e clínico no uso da cannabis medicinal como ferramenta terapêutica no cuidado da saúde mental, especialmente em quadros relacionados à depressão, ansiedade, transtorno de estresse pós-traumático (TEPT) e dor crônica — todos frequentemente associados ao risco aumentado de suicídio.


Composição da Cannabis e Relevância Neuropsiquiátrica

A planta Cannabis sativa contém mais de 120 canabinoides, sendo os mais estudados:

  • Δ9-tetrahidrocanabinol (THC): principal composto psicoativo, atua nos receptores CB1 do sistema nervoso central, modulando neurotransmissores como dopamina, serotonina e GABA. Pode auxiliar na regulação do humor, mas em doses elevadas pode desencadear sintomas ansiosos e psicóticos em indivíduos predispostos.

  • Canabidiol (CBD): não possui efeito psicoativo clássico, tem perfil ansiolítico, antipsicótico e estabilizador de humor, atuando principalmente em receptores serotoninérgicos (5-HT1A) e no sistema endocanabinoide como modulador indireto.

Essa interação com o sistema endocanabinoide, que regula processos como humor, sono, estresse e memória, é a base para o uso da cannabis em saúde mental.


Indicações na Saúde Mental

  1. Ansiedade Generalizada e Transtornos Ansiosos

    • O CBD demonstra reduzir sintomas de ansiedade em estudos clínicos controlados, com destaque para situações de estresse agudo (como falar em público) e transtornos de ansiedade social.

    • Atua modulando a resposta ao cortisol e regulando a hiperatividade da amígdala cerebral.

  2. Depressão

    • Evidências sugerem que o CBD pode aumentar a neurogênese no hipocampo e regular circuitos serotoninérgicos, efeitos semelhantes a antidepressivos convencionais.

    • Embora não seja considerado primeira linha, pode ser útil como adjuvante em casos resistentes.

  3. Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT)

    • O uso de cannabis medicinal tem mostrado melhora no sono, redução de pesadelos recorrentes e diminuição da hiperexcitação em pacientes com TEPT, frequentemente associados ao risco suicida.

  4. Dor Crônica e Insônia

    • Condições de dor persistente e privação de sono estão diretamente relacionadas ao aumento do risco de ideação suicida.

    • Cannabis medicinal auxilia no manejo desses sintomas, impactando positivamente a saúde mental.


Relação com o Setembro Amarelo

O uso da cannabis medicinal pode ser um aliado no contexto da prevenção ao suicídio por três principais razões:

  1. Redução do Sofrimento Psíquico: melhora sintomas de ansiedade, depressão e TEPT, que estão entre os maiores fatores de risco para suicídio.

  2. Melhora da Qualidade de Vida: alívio da dor crônica e melhora do sono impactam diretamente na saúde emocional.

  3. Integração Multidisciplinar: cannabis deve ser utilizada como coadjuvante, dentro de um plano terapêutico que inclui psicoterapia, acompanhamento psiquiátrico e suporte social.


Considerações Éticas e Clínicas

  • A prescrição deve ser feita por médico habilitado, após avaliação criteriosa.

  • Deve-se optar preferencialmente por formulações com CBD predominante, devido ao melhor perfil de segurança psiquiátrica.

  • É fundamental esclarecer aos pacientes que a cannabis não substitui antidepressivos ou psicoterapia, mas pode ser uma estratégia complementar.

  • O uso inadequado, principalmente de produtos com alto teor de THC sem acompanhamento médico, pode agravar sintomas psiquiátricos.


Conclusão

No cenário do Setembro Amarelo, é urgente ampliar a discussão sobre novas ferramentas terapêuticas que possam reduzir o sofrimento mental e prevenir o suicídio. A cannabis medicinal emerge como uma alternativa promissora, com evidências crescentes no manejo de ansiedade, depressão, TEPT e dor crônica.

No entanto, seu uso deve ser sempre pautado na ciência, ética médica e regulamentação vigente, reforçando a importância do cuidado multidisciplinar.

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📚 Referências Bibliográficas

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  2. Organização Mundial da Saúde (OMS). Suicide prevention. 2023. Disponível em: https://www.who.int/news-room/fact-sheets/detail/suicide

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  10. Elms, L., Shannon, S., Hughes, S., & Lewis, N. (2019). Cannabidiol in the treatment of post-traumatic stress disorder: A case series. Journal of Alternative and Complementary Medicine, 25(4), 392–397.

  11. National Academies of Sciences, Engineering, and Medicine (NASEM). (2017). The health effects of cannabis and cannabinoids: The current state of evidence and recommendations for research. Washington, DC: The National Academies Press.


Cannabis Medicinal na Saúde Mental e sua Relação com o Setembro Amarelo

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